segunda-feira, 28 de janeiro de 2008

Um Urubu quase santo



Foto: Lagoa de Maricá - RJ 2008.
Antonio Francisco

"Todo fim de ano eu passo
De frente a mesma favela
Na esperança de ver
O Natal brilhando nela,
Mas só vejo a mão do mundo
Batendo no povo dela.

Um povo que vive bem
Distante do cidadão,
Entre urubus e porcos
Numa terrível missão:
Tirar o pão que mastiga
Da gordura do lixão.
[...]

E todo ano que eu passo
Naquela comunidade,
Eu deixo quase sem força
Minha força de vontade
E a minha fé perdida
Entre os pés da humanidade.


Mas, neste ano passado,
Quando eu entrei na favela,
Eu vi o brilho da luz
Do Natal brilhando nela
E a esperança brincando
Nos olhos do povo dela.

Todo arremedo de casa
Tinha uma mesa na frente
Coberta de carne assada,
[...]

Todo menino sambudo
Tinha um brinquedo na mão,
Computador, bicicleta,
Carroça, carro, avião,
[...]

E quanto mais eu entrava,
Mais eu ficava intrigado:
Comida por todo canto,
brinquedo pra todo lado,
E todo mundo gritando:
Papai Noel, obrigado!
[...]

- Rapaz, desculpe a pergunta,
Mas o que está havendo?
Quem está patrocinando
A festa que estou vendo?
E que carne estranha é essa
Que vocês estão comendo?

Respondeu: Papai Noel
Ontem caiu no lixão!
E só não morreu da queda
Porque caiu num montão
De papel e saco plástico,
Pano velho e papelão.
[...]

A rena mestra morreu
Na hora da barruada.
As outras foram abatidas
Às duas da madrugada
E desde que o sol saiu
Que mastigam carne assada!

O trenó, eles mataram
No fundo de um quintal,
E venderam o aluninio
Ao filho de Antoin Vital,
E com a grana compraram
A bebida do Natal.


Papai Noel, sem dinheiro,
Liso, batendo biela,
Ficou aqui com a gente
Passeando na favela
E dividindo os brinquedos
Com a gurizada dela.
[...]

E sai falando só,
Coçando o canto da nuca:
- Papai Noel de verdade?
Que história mais maluca...
Ou ele quis me gozar
Ou está lelé da cuca!

Mas quando eu ergui a vista,
Avistei numa viela
Um velhinho de vermelho
Numa casa da favela
Distribuindo brinquedos
Com os moradores dela.

Pensei logo: - É um político
Visitando o povo seu.
Mas depois da eleição
Isso nunca aconteceu!
Deve ser um evangélico
Praticando o que aprendeu.
[...]

Mas quando cheguei, perdi
Da cor do rosto a metade,
Pois o velhinho que estava
Ali na comunidade,
Não era outro senão
Papai Noel de verdade!
Eu gritei Papai Noel,
O senhor enlouqueceu...
Você nunca andou aqui,
Só agora apareceu
Bancando uma festa dessa.
O que foi que aconteceu?
[...]

Papai Noel disse: - Amigo,
Quando eu cai no lixão
Perdi meu talão de cheque,
Meu celular, meu cartão.
E onde eu moro, poeta,
só vai se for de avião!


Respondi: - Papai Noel,
Eu não posso fazer nada.
Poeta, aqui na cidade,
Vive de mão estirada,
Mas vou lhe dar um conselho,
Só não sei se lhe agrada:

Você vá pedir ajuda
Naqueles muros de medos,
Munidos de cerca elétrica,
Com pilastras de lajedos,
Onde você, todo ano,
Vai despejar seus brinquedos!


Ele baixou a cabeça
E disse, fitando o chão:
- É mais fácil eu conseguir
Apanhando papelão
Do que entrar sem brinquedos
Na casa de um barão.

E levantou-se dizendo:
- Poeta, muito obrigado!
É bom estar com você.
Mas, já estou atrasado,
O lixão agora tem
Mais um desempregado.


E perdeu-se nas estranhas
Montanhas de papelão.
Eu quis chorar, mas pensei:
- Não é nada de mais, não.
E quantos papais noéis
Não vivem deste lixão?!
[...]

Rio: mulher é presa suspeita de racismo em cinema.



Foto: Ponte Rio - Niterói. by Crau 01/2008.

A produtora Ana Cristina de Paiva, 40 anos, foi presa na noite de ontem, na Barra da Tijuca, zona oeste do Rio de Janeiro, por suspeita de racismo. Uma atendente do cinema do Shopping Downtown alega ter sido chamada de "negrinha" pela produtora. Ana Cristina vai responder pelo crime de injúria por preconceito racial, cuja pena pode chegar a 3 anos de prisão.


De acordo com a vítima, que preferiu não se identificar, e com testemunhas, a confusão começou quando Ana Cristina entregou o cartão de crédito para pagar por pipocas que havia comprado.
"O pagamento não foi autorizado. Eu informei e ela disse que eu é que não estava sabendo usar o equipamento. Eu disse, então, para que ela mesma tentasse, já que pensava que eu não sabia trabalhar. Ela ficou furiosa, quis passar para o lado de dentro do balcão para me bater e disse que eu era uma negrinha e que devia estar morando na Rocinha", contou a jovem.
De acordo com testemunhas, a produtora gritava e a balconista chorava. "Foi um absurdo o que aconteceu. A mulher ainda perguntou: 'quer que eu a descreva como? Ela é negrinha da Rocinha mesmo, não é nenhuma princesinha da Barra.' Espero que ela seja punida, porque a impunidade deixa a gente ainda mais indignado", contou o professor de inglês Davi Ferreira de Pinho, uma das quatro testemunhas que foram à 16ª Delegacia de Polícia (Barra) acompanhar a vítima.
"Eu vim aqui cumprir meu papel de cidadã. Nós iríamos assistir ao filme O caçador de pipas, que fala sobre preconceito, e de repente acontece uma coisa dessas. Só de saber que essa mulher vai ficar presa, fico mais aliviada. Ela é uma criminosa. Não faz idéia do dano psicológico que pode causar a uma pessoa", disse outra testemunha, lembrando que a delegacia recebeu telefonemas para denunciar o caso.
Para a vítima, a sensação foi de constrangimento. "Não pensei que isso fosse acontecer comigo. Ela ameaçou me bater e disse que negrinha tem que morrer de trabalhar", disse.
O marido de Ana Cristina, que não teve o nome revelado, defendeu a mulher: "chamar uma negrinha de negrinha e um crioulo de crioulo é crime? Como é que eu diferencio? Acho que isso é síndrome de novela", comentou. Já a advogada de Ana Cristina não quis comentar o caso.

http://noticias.terra.com.br/brasil/interna/0,,OI2267835-EI5030,00.html

sexta-feira, 4 de janeiro de 2008



Noite sem lua ou estrelas
o bebedor de sakê
bebe sozinho.

Matsuo Bashô


BLOG FECHADO SEM TEMPO DETERMINADO.